terça-feira, 13 de maio de 2008

1 dia em Pequim


Decidi transcrever as anotações que fiz na noite do dia 15 de dezembro de 2007, quando ainda estava em Pequim.

Entrei numa pequena loja num hutong, em Hou Hai, vi esse caderno para vender e pensei em começar um pequeno relato de viagem aqui na China. Nunca escrevi comentários nem observações sobre minhas viagens, mas minhas impressões desse país são tantas que tentarei registrar algumas nesse caderno, não apenas para recordação, mas principalmente para posterior reflexão.
Hoje eu e um amigo fizemos um tour em Pequim. Não definimos um roteiro específico; minha única idéia fixa era visitar o Mausoléu de Mao Tsé Tung, ou Mao Zedong, como preferirem. Pegamos um táxi - não fomos de metrô porque já era tarde, considerando que o horário de visitação do Mausoléu termina às 11h - e paramos em Tian'an Men, a Praça da Paz Celestial, onde o Mausoléu se localizada, mirando a Cidade Proibida e adjacente ao Parlamento.

A fila estava enorme, mas ainda tivemos de deixar nossas mochilas e máquinas fotográficas num guarda-volumes à esquerda da Praça (fotos são terminantemente proibidas no Mausoléu). Um chinês, em troca de alguns trocados, nos acompanhou ao guarda-volumes e, para se mostrar merecedor de módica gorjeta, nos ajudou a guardar nossos pertences na mochila e não hesitou em furar fula - prática recorrente na China - para que não perdêssemos tempo. Esse é o tipo de serviço VIP nesse país. Dei RMB10 ao cara, mesmo tendo pedido RMB20.

Entramos finalmente na fila, junto com outras centenas, talvez milhares, de chineses. A impressão que tive foi a de que, se cada mulçumano deve ir ao menos uma vez na vida a Meca, todo chinês deve prestar homenagem ao Chairman. Dá para perceber que são pessoas vindas de várias partes do país, muitas vestindo trajes bem simples, aparentando ter juntado dinheiro por anos para, um dia, vir a Pequim e homenagear o camarada Mao.

Passamos por um detector de metais. Nosso passeio quase teve de ser adiado, pois acharam que o celular do meu amigo era uma máquina fotográfica. De fato, o aparelho tinha esse recurso, mas nos deixaram seguir adiante.

Foi curioso me deparar, logo após a sala dos detectores de metais, já no pátio que dava acesso ao Mausoléu, uma banca que vende flores para serem depositadas ao pé da estátua de Mao, sentado de maneira descontraída, com a perna cruzada (não me lembro se a direita ou a esquerda), logo na entrada do Mausoléu. Não são poucos aqueles que fazem questão de comprar rosas avulsas ou buquês com flores diversas. Isso porque Mao é devotado como um santo pelos chineses, mesmo porque religião não é um forte na cultura chinesa atual, devido ao controle exercido pelo Partido Comunista desde a ascensão ao poder, em 1949. Não por acaso, mais de 40% dos chinese declaram-se sem religião. Há, no entanto, uma espécie de religião de Estado, sendo a figura de Mao seu mais poderoso e eficaz símbolo.

Essa questão da devoção fica ainda mais presente ao lermos uma placa logo na entrada do prédio, pedindo que os chapéus fossem retirados e que se faça silêncio no interior do Mausoléu. O mais impressionante é que os chineses obedecem a ambos os pedidos.

A visita é bastante rápida, pois não é possível parar diante do corpo de Mao, já que milhares de pessoas esperam na fila do lado de fora. No hall de entrada, formam-se 2 filas que dão acesso à sala principal onde está o corpo embalsamado do Chief, dentro de um sarcófago de vidro vigiado por 2 guardas do exército chinês.

Confesso que cheguei a duvidar se aquela realmente seria a múmia de Mao Zedong, pois a semelhança com aqueles bonecos de cera do Madame Tussauds é enorme. O mais impressionante é o excelente estado de conservação do cadáver. Li em algum lugar que o Mausoléu fica fechado por alguns dias do ano para manutenção do corpo.

Outra observação: foi a única vez que vi os chineses respeitando fila. Atribuo esse fenômeno à vontade de cada chinês estar o mais próximo possível de Mao e a fila ordenada permitia isso.

Logo na saída da sala principal, mas antes de sair do prédio, deparamo-nos com várias bancadas onde se vendia diversos objetos contendo a imagem de Mao. É interessante como os chineses absorveram tão rapidamente as práticas capitalistas. Na China, há bancas vendendo bugigangas até dentro de banheiros públicos. Qualquer museu, parque, praça ou templo (até mesmo dentro do Parlamento), há bancas vendendo souvenirs aos turistas, em sua grande maioria chineses.

Nosso próximo destino foi o antigo quarteirão onde estavam situadas as legações estrangeiras. Não há muito o que ver, pois grande parte dos prédios históricos foi destruído durante a Revolução dos Boxers, em 1900. Além disso, o que restou era idenficado apenas com placas em mandarim. Tive de me contentar com as informações do Lonely Planet. Como não me lembro dos detalhes, vou passar direto para Hou Hai, nosso próximo destino após uma rápida, porém estratégica parada para almoço.

Gostei de Hou Hai. Logo que chegamos, paramos para tomar um café no Starbuck's. Saindo de lá, não resisti e tomei um suco natural de romã, espremido na hora (bom!!!). Demos uma volta ao redor do lago parcialmente congelado, passando por um hutong, onde comprei esse caderno.

Para fechar o dia, fomos ao restaurante Li Qun, considerado um dos 10 melhores de Pequim, para comermos o famoso pato laqueado. O restaurante é um pé-sujo, também localizado dentro de um hutong. É o tipo de restaurante que eu nem passaria perto se não tivesse sido altamente recomendado por guias turísticos e por pessoas que já estiveram lá. Para se ter uma idéia do nível do restaurante, está pintado à mão, na parede do banheiro, a frase "no shit". Mas valeu a pena. A comida é realmente muito boa, melhor que o pato laqueado que comi logo na primeira semana que cheguei em Pequim, num restaurante "para inglês ver" em Wangfujin. Nesse restaurante para gringo, recebi um certificado com o número do pato que comi, contado desde o primeiro servido quando o restaurante foi aberto.

2 comentários:

Unknown disse...

Lindo,
Achei muito interessante, mesmo sabendo de muitas coisas da sua viagem, as suas sensações naquele momento. Não sei se vc teve tempo de escrever nos outros dias, mas imagino que tenha sido, além de um ótimo exercício, um registro pessoal do que vc viveu lá. Porque, por mais que vc tenha tirado mil fotos, filmado centenas de filmes...Nada se compara aos detalhes que vc colocou no seu caderno.
Desejo que vc continue viajando o mundo todinho e continue escrevendo sobre tudo que vc venha a conhecer...assim, aqueles que te amam poderão conhecer tudo isso junto com vc.

Unknown disse...

Impagável esse "no shit" escrito na parede... :o)