quarta-feira, 28 de maio de 2008

Um país sem irmãos

Com essa, já são 3 as postagens sobre a China. Provavelmente outras surgirão, pois muitas "algumas impressões" sobre aquele país ainda estão vivas em minha memória.

Conversando com uma guia turística em Xi'an, ela começou a falar de seu filho. Não me lembro exatamente sobre o que conversávamos, mas, de repente, faço a pergunta mais idiota que alguém poderia fazer a um chinês: "você só tem um filho?" Elegantemente, Lisa (esse é o seu nome ocidental) relembrou-me da política de filho único praticada na China desde a década de 1970. Mas gafes acontecem, até mesmo com presidentes da República... Minha gafe, no entanto, foi o gancho que Lisa precisava para me perguntar: "você tem irmãos?" Seus olhos brilharam quando respondi positivamente à pergunta. Acredito que, se dependesse apenas de sua vontade, teria mais algum(ns) filho(s). Preferi mudar de assunto.

A reação de Lisa me levou a conversar com algumas pessoas sobre os efeitos psicológicos de uma sociedade sem irmãos. Um é que, na ausência de um irmão de sangue, os chineses buscam criar laços fraternais com seus melhores amigos. Ou seja, "já que não tem tu, vai tu mesmo".

Um segundo efeito mostra como pode ser perverso essa política. Como os pais têm apenas um filho, eles querem que ele seja o melhor em tudo. Assim, querem que seu filho seja o melhor na escola, o melhor atleta da turma, que toque um instrumento musical de maneira virtuosa, que fale inglês como um nativo... São tantas exigências (e as atividades são postas em prática na tentativa de se atingir os desejos dos pais) que as crianças mal têm tempo para se dedicarem ao lazer. Eles têm, literalmente, compromissos de segunda a domingo. Salvo engano, em muitos casos, seus horários de lazer resumem-se a 2 ou 3 horas nas sextas-feiras à tarde.

Alguma recompensa os pais têm de oferecer a seus atarefados filhos. E a recompensa, talvez até por remorso, é o mimo.

O que mais preocupa as pessoas com as quais conversei (todas ocidentais) é sobre a futura liderança do país, que será comandado por uma geração de adultos mimados. Apesar de muito bem informados, terão pouco conhecimento de como o sistema realmente funciona, já que foram super protegidos pelos pais. É claro que muitos mimados chegaram ao poder no Ocidente. O problema é quando toda uma geração possui essa característica.

Em meio a tanta tragédia em decorrência dos terremotos na China, uma boa notícia: o governo relaxou a política de filho único e anunciou, nessa semana, que os pais que têm filhos feridos ou mortos pela tragédia poderão ter novo filho ou adotar quantos órfãos quiserem. Esses, a despeito do infortúnio, terão o privilégio legal de ter aquilo que muitos chineses possuem apenas em sonhos: um irmão.

sexta-feira, 23 de maio de 2008

Feriados


Corpus Christ foi o último feriado nacional que caiu em dia útil nesse ano antes do Natal. Todos os outros cairão no sábado ou domingo. Além disso, os 2 últimos feriados nacionais caíram numa quinta-feira, e muitos acabaram emendando a sexta-feira seguinte. Tudo isso me fez pensar que os feriados no Brasil deveriam ser objeto de discussão no Congresso Nacional.

Lembro-me de que, quando ainda estava na China, o governo consultou a população, em um raro momento democrático naquele país, sobre possíveis mudanças no calendário de feriados chineses, que, apesar de poucos, duravam uma semana inteira, causando transtornos em todo o país. Milhões de pessoas viajam ao mesmo tempo para visitar familiares em outras cidades ou como turistas.

Feriados no Brasil deveriam ser como a maioria deles nos Estados Unidos. Lá, os feriados são definidos de forma a sempre caírem numa segunda ou sexta-feira, permitindo um final de semana prolongado. Exemplos:
Memorial Day: última segunda-feira do mês de maio
Martin Luther King, Jr. Day: 3ª segunda-feira do mês de janeiro
Thanksgiving Day: 4ª quinta-feira do mês de novembro (nesse caso, os americanos também não trabalham na sexta-feira)

Só vejo vantagens nessa medida. Primeiro, concentrando os feriados antes ou depois do final de semana, não se corre o risco de as pessoas emendarem os feriados que caiam na terça ou na quinta, eliminando a chamada "semana morta" no Brasil. Nesse ponto, o mercado financeiro agradece.

Segundo: a indústria do turismo não perderia com eventuais feriados que caiam em finais de semana ou nas quartas-feiras. No segundo semestre desse ano, por exemplo, só viajarão aqueles que têm férias a gozar ou aqueles que não têm mais o que fazer da vida a não ser viajar mesmo.

Terceiro: ninguém precisará ficar olhando no calendário quando cairá, por exemplo, o feriado de Tiradentes, caso fosse determinado que esse feriado sempre cairá na 3ª sexta-feira do mês de abril.

O Carnaval merece atenção especial, pois, em partes, funciona da forma que eu gostaria que fosse. Mas não é bem assim, pois, apesar de cair sempre entre segunda e quarta-feira até o meio-dia, pode cair em qualquer semana entre o início de fevereiro e meados de março. Em 2008, esse feriado caiu logo na primeira semana de fevereiro, não muito depois dos feriados de Natal e Ano Novo. A indústria do turismo queixou-se com a redução dos lucros auferidos nesse ano durante o feriado, pois muita gente não conseguiu juntar dinheiro a tempo para programar nova viagem um mês após o Ano Novo. Para a vinda de turistas estrangeiros, a definição de uma data pré-determinada ajudaria a divulgar o evento fora do país, permitindo que os estrangeiros programem com precisão sua visita ao Brasil, de modo que coincida com a maior festa popular do mundo.

Caso essa sugestão fosse adotada no país, poderíamos, inclusive, diminuir o número de feriados nacionais. Para não desprestigiar nenhum homenageado, alguns poderiam cair sempre num sábado ou domingo qualquer, para que o feriado não seja extinto.

Será que a sociedade compraria essa idéia?

segunda-feira, 19 de maio de 2008

O petróleo e a ordem mundial


A revista Newsweek da semana passada publicou em sua página 4 comentário de John Sparks e Stefan Theil sobre um possível cenário de quando o petróleo alcançar o preço de U$200/barril. Além do uso político dos lucros obtidos por parte de governos autoritários em grandes países produtores de petróleo, os autores indicam que a tese do "mundo plano", de Milton Friedman, poderia estar perto do fim. De acordo com essa teoria, a competição entre países desenvolvidos e em desenvolvimento está acabando, pois ambos teriam as mesmas oportunidades.

Num cenário onde o preço do barril de petróleo atinja a marca de U$200, os custos de transporte e energia tornariam inviável a produção de bens em países distantes dos grandes mercados consumidores. Assim, bens produzidos na China terão de ser majoritariamente vendidos na Ásia para que se mantenha a competividade desses produtos; os EUA terão de obter seus produtos no próprio continente americano, caso queira manter seu atual padrão de consumo.

As análises sobre o sistema internacional têm de ser constantemente reformuladas. Teóricos e estrategistas, ao desenvolverem suas idéias, tendem a analisar o processo apenas de maneira evolutiva. Mas o mundo não é lógico. Ou talvez seja, mas nós ainda não estamos acostumados em analisar todas as variáveis possíveis e (in)imagináveis. Não é por acaso que o mundo assiste, perplexo, à alta dos preços dos alimentos no comércio internacional.

As teses desenvolvidas pela CEPAL, durante a década de 1950, indicavam que haveria deterioração dos termos de troca entre os produtos exportados pelos países periféricos (matérias-primas) e entre aqueles importados dos países centrais (bens industriais). A solução para os países latino-americanos seria a substituição de suas importações, criando incentivos para o desenvolvimento da indústria nacional.

Passado mais de meio século, os bens industrializados são hoje os que relativamente vêm deteriorando em relação às matérias-primas. O preço dos alimentos e dos insumos tem registrado aumentos constantes nos últimos anos. Já os preços dos bens industrializados só tendem a cair, devido, em grande parte, aos avanços tecnológicos. Basta imaginar quanto custava um aparelho de DVD ou um celular há 10 anos. A boa notícia para as indústrias é que, para anular esse efeito, novas tecnologias são desenvolvidas diariamente, criando e impondo novas necessidades aos consumidores.

Veremos se o fim do "mundo plano" realmente ocorrerá. Provavelmente não, pois creio que a criatividade humana conseguirá manter, e mesmo acelerar, o atual processo de globalização. Talvez, no entanto, seja necessário atravessar um período de ajuste, em que as previsões de Sparks e Theil possam se concretizar, mesmo que temporariamente.

sexta-feira, 16 de maio de 2008

Natureza em fúria



Por mais trágico que seja, acho plausível um terremoto matar mais de 20 mil pessoas, ainda mais quando se trata da China, um país onde qualquer catástrofe natural toma gigantescas proporções, dada a quantidade de pessoas vivendo naquele país.

Impressiona-me, no entanto, um vento ser capaz de matar mais de 70 mil (!!!) pessoas, principalmente se considerarmos que a metereologia possui meios de prever esse tipo de fenômeno.

Confesso que ainda não consegui absorver o número de mortos, feridos e desabrigados em ambas as tragédias. A cada dia que vejo as estatísticas atualizadas, penso tratar-se de erro de digitação por parte do jornalista.

Que a Natureza dê uma trégua!

terça-feira, 13 de maio de 2008

1 dia em Pequim


Decidi transcrever as anotações que fiz na noite do dia 15 de dezembro de 2007, quando ainda estava em Pequim.

Entrei numa pequena loja num hutong, em Hou Hai, vi esse caderno para vender e pensei em começar um pequeno relato de viagem aqui na China. Nunca escrevi comentários nem observações sobre minhas viagens, mas minhas impressões desse país são tantas que tentarei registrar algumas nesse caderno, não apenas para recordação, mas principalmente para posterior reflexão.
Hoje eu e um amigo fizemos um tour em Pequim. Não definimos um roteiro específico; minha única idéia fixa era visitar o Mausoléu de Mao Tsé Tung, ou Mao Zedong, como preferirem. Pegamos um táxi - não fomos de metrô porque já era tarde, considerando que o horário de visitação do Mausoléu termina às 11h - e paramos em Tian'an Men, a Praça da Paz Celestial, onde o Mausoléu se localizada, mirando a Cidade Proibida e adjacente ao Parlamento.

A fila estava enorme, mas ainda tivemos de deixar nossas mochilas e máquinas fotográficas num guarda-volumes à esquerda da Praça (fotos são terminantemente proibidas no Mausoléu). Um chinês, em troca de alguns trocados, nos acompanhou ao guarda-volumes e, para se mostrar merecedor de módica gorjeta, nos ajudou a guardar nossos pertences na mochila e não hesitou em furar fula - prática recorrente na China - para que não perdêssemos tempo. Esse é o tipo de serviço VIP nesse país. Dei RMB10 ao cara, mesmo tendo pedido RMB20.

Entramos finalmente na fila, junto com outras centenas, talvez milhares, de chineses. A impressão que tive foi a de que, se cada mulçumano deve ir ao menos uma vez na vida a Meca, todo chinês deve prestar homenagem ao Chairman. Dá para perceber que são pessoas vindas de várias partes do país, muitas vestindo trajes bem simples, aparentando ter juntado dinheiro por anos para, um dia, vir a Pequim e homenagear o camarada Mao.

Passamos por um detector de metais. Nosso passeio quase teve de ser adiado, pois acharam que o celular do meu amigo era uma máquina fotográfica. De fato, o aparelho tinha esse recurso, mas nos deixaram seguir adiante.

Foi curioso me deparar, logo após a sala dos detectores de metais, já no pátio que dava acesso ao Mausoléu, uma banca que vende flores para serem depositadas ao pé da estátua de Mao, sentado de maneira descontraída, com a perna cruzada (não me lembro se a direita ou a esquerda), logo na entrada do Mausoléu. Não são poucos aqueles que fazem questão de comprar rosas avulsas ou buquês com flores diversas. Isso porque Mao é devotado como um santo pelos chineses, mesmo porque religião não é um forte na cultura chinesa atual, devido ao controle exercido pelo Partido Comunista desde a ascensão ao poder, em 1949. Não por acaso, mais de 40% dos chinese declaram-se sem religião. Há, no entanto, uma espécie de religião de Estado, sendo a figura de Mao seu mais poderoso e eficaz símbolo.

Essa questão da devoção fica ainda mais presente ao lermos uma placa logo na entrada do prédio, pedindo que os chapéus fossem retirados e que se faça silêncio no interior do Mausoléu. O mais impressionante é que os chineses obedecem a ambos os pedidos.

A visita é bastante rápida, pois não é possível parar diante do corpo de Mao, já que milhares de pessoas esperam na fila do lado de fora. No hall de entrada, formam-se 2 filas que dão acesso à sala principal onde está o corpo embalsamado do Chief, dentro de um sarcófago de vidro vigiado por 2 guardas do exército chinês.

Confesso que cheguei a duvidar se aquela realmente seria a múmia de Mao Zedong, pois a semelhança com aqueles bonecos de cera do Madame Tussauds é enorme. O mais impressionante é o excelente estado de conservação do cadáver. Li em algum lugar que o Mausoléu fica fechado por alguns dias do ano para manutenção do corpo.

Outra observação: foi a única vez que vi os chineses respeitando fila. Atribuo esse fenômeno à vontade de cada chinês estar o mais próximo possível de Mao e a fila ordenada permitia isso.

Logo na saída da sala principal, mas antes de sair do prédio, deparamo-nos com várias bancadas onde se vendia diversos objetos contendo a imagem de Mao. É interessante como os chineses absorveram tão rapidamente as práticas capitalistas. Na China, há bancas vendendo bugigangas até dentro de banheiros públicos. Qualquer museu, parque, praça ou templo (até mesmo dentro do Parlamento), há bancas vendendo souvenirs aos turistas, em sua grande maioria chineses.

Nosso próximo destino foi o antigo quarteirão onde estavam situadas as legações estrangeiras. Não há muito o que ver, pois grande parte dos prédios históricos foi destruído durante a Revolução dos Boxers, em 1900. Além disso, o que restou era idenficado apenas com placas em mandarim. Tive de me contentar com as informações do Lonely Planet. Como não me lembro dos detalhes, vou passar direto para Hou Hai, nosso próximo destino após uma rápida, porém estratégica parada para almoço.

Gostei de Hou Hai. Logo que chegamos, paramos para tomar um café no Starbuck's. Saindo de lá, não resisti e tomei um suco natural de romã, espremido na hora (bom!!!). Demos uma volta ao redor do lago parcialmente congelado, passando por um hutong, onde comprei esse caderno.

Para fechar o dia, fomos ao restaurante Li Qun, considerado um dos 10 melhores de Pequim, para comermos o famoso pato laqueado. O restaurante é um pé-sujo, também localizado dentro de um hutong. É o tipo de restaurante que eu nem passaria perto se não tivesse sido altamente recomendado por guias turísticos e por pessoas que já estiveram lá. Para se ter uma idéia do nível do restaurante, está pintado à mão, na parede do banheiro, a frase "no shit". Mas valeu a pena. A comida é realmente muito boa, melhor que o pato laqueado que comi logo na primeira semana que cheguei em Pequim, num restaurante "para inglês ver" em Wangfujin. Nesse restaurante para gringo, recebi um certificado com o número do pato que comi, contado desde o primeiro servido quando o restaurante foi aberto.

segunda-feira, 12 de maio de 2008

O Blog

Sempre resisti à tentação de criar meu blog. Dessa vez, sinto que não posso mais me excluir desse universo de criação infinito que a internet nos proporciona. Todos temos algo a dizer, mesmo que isso não interesse a ninguém.
Acho que minha resistência de criar um blog deriva de dois medos. O primeiro é de ninguém se dar ao trabalho de parar alguns minutos para ler o que eu tenho a dizer. O segundo medo é de justamente não ter nada de interessante a dizer, nada de original, nada de criativo. Poderia acrescentar um terceiro item à lista, que não seria necessariamente um medo, mas sim curiosidade em relação às críticas aos meus comentários.
Acho que o sucesso dos blogs deve-se, em parte, à curiosidade em relação aos comentários sobre nossas impressões. Antes da internet, quem tinha algo a dizer poderia criar uma espécie de diário (acho que a palavra journal, em inglês, é mais apropriada). O problema é que esse tipo de material era (ou ainda é) feito para poucos, isso quando não se restringia somente à pessoa que o estava escrevendo. Difilcimente os journals eram comentados, a não ser quando veiculados pela imprensa escrita (confesso que não saberia citar nenhum agora; só Anne Frank vem à minha mente ). Mas com o blog é diferente. Ele fica armazenado nessa rede virtual anárquica, porém ordenada, onde qualquer pessoa pode ter acesso a pensamentos, críticas, comentários...
Foi por isso que me convenci a iniciar meu próprio journal virtual . Não sei se durará. Sei apenas que dei o pontapé inicial.
Sejam bem-vindos. Espero que gostem.